Herdade do Portocarro: a filosofia do “Cavalo Maluco”

Quando criança, na brincadeira de índios e cowboys, ele queria ser índio. Seu pai, médico, gostaria que ele seguisse a sua profissão, mas ele decidiu ser vinicultor. E, na carreira que abraçou com paixão, continua contrariando as regras. Produz um rótulo com uma casta nem um pouco convencional em seu país, a Sangiovese, numa região com pouca ou quase nenhuma tradição no cultivo de uvas viníferas. É adepto das práticas orgânicas de cultivo e tem como sua uva local preferida a Touriga Franca, normalmente usada em cortes.

Assim é o português José da Mota Capitão (foto), ou simplesmente “Pepe”, proprietário da Herdade do Portocarro, vinícola que embora situada no Torrão, Alentejo, pertence formalmente ao distrito de Setúbal. “Esta será a próxima grande região do país”, profetiza.

Conheci esse simpático produtor em um almoço harmonizado promovido no Recife pelo importador Licínio Dias. Naquela ocasião, ele apresentou os seus três principais rótulos (Herdade do Portocarro, Anima e Cavalo Maluco) e conversou sobre suas técnicas e projetos.

Embora conte com a ajuda do enólogo João Torres e tenha usufruído da consultoria de Paulo Laureano, um verdadeiro mestre da vitivinicultura portuguesa, é José da Mota Capitão quem decide tudo.  Se o vinho, já no barril, para ele não está bom, é despejado fora. Mesmo que isso lhe custe um bom punhado de Euros.

Quando decidiu produzir vinho na região onde está instalado, foi chamado de louco. Afinal, aquela zona é conhecida pelo plantio de arroz, criação de gado e produção de cortiça. Mas Pepe percebeu que o local poderia ter vocação para a vitivinicultura, já que possui um clima fresco e ensolarado. “Temos uma amplitude térmica de 20ºC. Durante o dia a temperatura chega aos 35ºC e à noite aos 15ºC”, explica.

Sua propriedade conta com 15 hectares de vinhedos, divididos em três lotes. A produção anual é de 40 mil garrafas, das quais metade fica em Portugal e a outra metade é exportada para dez países. Pepe não tem pretensão de ser um produtor de larga escala. Segundo ele, sua plantação funciona de modo biológico, pois as condições locais são de boa sanidade, sem problemas com pragas de insetos. O único controle feito é uma aplicação de cobre e outra de enxofre por ano.

Seus vinhos têm uma ótima acidez, teor alcoólico não muito elevado e bom frescor. São elegantes e fáceis de tomar. Sua elaboração segue conceito de “single vineyard” e toda a bebida é fermentada em cubas de carvalho francês.

Além dos tintos, Capitão está produzindo um vinho branco chamado Alfaiate, com uvas Serceal, Arinto, Antão Vaz e Galego Dourado, e também um vinho mais simples, de garrafão com 5 litros, batizado com o curioso nome de “Espanta Espírito”, feito com as castas Aragonês e Alfrocheiro. Esses rótulos ainda não estão no mercado brasileiro, mas devem aportar por aqui em breve.

Confira os comentários sobre os vinhos provados durante o almoço, que aconteceu no restaurante Ferreiro Premium, com as suas devidas (e deliciosas) harmonizações:

Anima L6 – 2006

Produtor: Herdade do Portocarro.
Origem: Península de Setúbal, Portugal.
Visual: Cor granada.
Olfato: Fruta fresca do bosque, mentol, baunilha, terra molhada.
Paladar: Leve e fresco, repete as impressões do nariz. Boa acidez.
Outras considerações: Elaborado 100% com a uva italiana Sangiovese. A inspiração veio do Brunello de Montalcino, tinto italiano do qual José da Mota Capitão é um grande apreciador. Estagiou 12 meses em barricas francesas. Sua graduação alcoólica é de 13%.
Harmonização: Codorna recheada ao molho de uvas e avelãs.

Classificação: Excelente
Faixa de preço: R$ 168*

Herdade do Portocarro – 2008

Produtor: Herdade do Portocarro.
Origem: Península de Setúbal, Portugal.
Visual: Rubi claro com tons violeta.
Olfato: Jambo maduro, chocolate, café e baunilha.
Paladar: Fresco, leve e com final apimentado. Traz de volta as sensações do ofato.
Outras considerações: Tem em sua composição as uvas Aragonês, Alfrocheiro e Cabernet Sauvignon. Amadureceu em carvalho francês por 12 meses. Tem 13,5% de álcool.
Harmonização: Papardele com ragú de pato.

Classificação: Excelente
Faixa de preço: R$ 80*.

Cavalo Maluco – 2008

Produtor: Herdade do Portocarro.
Origem: Península de Setúbal, Portugal.
Visual: Rubi profundo, brilhante.
Olfato: Fruta vermelha madura, caramelo e café.
Paladar: De ótima complexidade. Além da fruta e das outras características do nariz, mostra sabores como melaço, couro e mentol. Ótima acidez e final marcante.
Outras considerações: Foi feito com as uvas Touriga Franca, Touriga Nacional e Petit Verdot. Teve amadurecimento de 16 meses em carvalho francês. É uma homenagem de Pepe ao índio da tribo norte-americana Sioux, “Crazy Horse”, um dos seus ídolos de infância.
Harmonização: Carré de cordeiro crocante com purê rústico de batatas.

Classificação: Excelente.
Faixa de preço: R$ 189*.

*Vinhos importados pela Licínio Dias (LD) Importação (81) 3125.8080 e Épice (11) 2910 4662 .

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0 Replies to “Herdade do Portocarro: a filosofia do “Cavalo Maluco””

  1. Fabiana, bebi recentemente o herdade e o cavalo maluco com meu irmão e noiva; maravilhosos, o cavalo maluco então é de uma profundidade excepcional!

    ABraço.

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